segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

O patrimônio material e as novas políticas/práticas de preservação de bens culturais

Por Aterlane Martins

Em texto anterior escrevi, apresentando um breve panorama da política oficial de preservação do patrimônio cultural no Brasil, destacando as transformações ocorridas desde antiga noção de patrimônio histórico e artístico à sua conotação atual, cujo foco ampliado baseia-se na noção antropológica de cultura, portanto denominado-o patrimônio cultural, mais amplo e integrado conceitualmente.

No presente texto apresento mais particularmente alguns aspectos dos bens materiais buscando relacioná-los, em sua trajetória e no contexto contemporâneo, às políticas públicas de patrimônio.

Os bens de “pedra e cal’’, assim referidos pela socióloga Maria Cecília Londres Fonseca, referem-se comumente aos bens móveis e imóveis e podem ser identificados entres outros como edifícios civis ou religiosos, públicos e privados (residências, templos, engenhos, cemitérios, teatros, casas de câmara e cadeia etc.), monumentos (estátuas, obeliscos, bustos etc.), objetos (de arte, de culto, utilitários, decorativos, móveis etc.), bibliotecas e arquivos (conjuntos documentais de valor histórico ou artístico), monumentos naturais e paisagens (jardins, montanhas, rios, reservas ecológicas etc.), bem como artefatos arqueológicos ou paleontológicos (urnas funerárias indígenas, ruínas de construções, fósseis etc.), entre outros, desde que sejam assim considerados pela sociedade e devidamente “consagrados” através do tombamento.

Desde 1937 até então, estes bens são protegidos pelo instrumento jurídico do Tombamento. Contraditório em si, por ter o poder de cessar o direito à propriedade privada em detrimento do “interesse social”, este instrumento legal foi inicialmente utilizado com a força “policialesca” que lhe é própria – mas que verificou-se inapropriada. Esta foi a marca conflituosa que durante muitas décadas figurou no imaginário social sobre a preservação do patrimônio cultural e sobre a instituição que a executa, o IPHAN.

Apenas na década de 1970, na gestão de Aloísio Magalhães no IPHAN, as práticas de preservação buscaram uma real aproximação com a comunidade. Assim o foi nos exemplos dos Seminários realizados em Ouro Preto e Olinda quando pela primeira vez a população local foi ouvida e pôde efetivamente participar da política preservação do seu patrimônio cultural.

Por mais paradoxal que possa parecer esta ainda é uma situação recorrente quando, sobretudo o poder público municipal, inicia sua prática preservacionista. Além das “novas políticas” darem continuidade à prática impositiva da preservação que afasta a população deste bens e impede os eu uso social, é comum percebermos que a sociedade também guarda esse imaginário e o reproduz.

Embora o instrumento jurídico de proteção, o tombamento, permaneça o mesmo, as ações dele decorrentes mudaram acompanhando as transformações sócio-históricas que inseriram um novo entendimento sobre a proteção e a gestão dos bens culturais tombados, ou seja, uma preservação onde a sociedade participa efetivamente usando e ressignificando estes espaços.

Em exercício de pesquisa, recentemente levado a cabo com os alunos da disciplina Cidadania e Patrimônio do curso técnico em Guia de Turismo do IFCE, pude constatar algumas destas permanências no que tange a compreensão sobre os bens materiais e sua proteção, particularmente na cidade de Quixadá. Contudo, algumas boas apropriações das práticas contemporâneas e o desejo de participação no processo preservacionista foram demonstrados pelos referidos alunos. Este, porém, é assunto para um texto seguinte.