sexta-feira, 2 de abril de 2010

Democratização das Possibilidades



Escrito por Alexandre Queiroz Pereira, publicado no Jornal O Povo

Na atualidade as manchetes vinculam uma “quase” unanimidade: o planeta vem perdendo drasticamente sua biodiversidade. A fauna e a flora, componentes de ecossistemas raros, são dizimadas dia-a-dia pela indústria, pela agropecuária e pela urbanização. Todavia, há outro grande problema não diretamente comentado: o desperdício cruel de potenciais talentos humanos.
Há algumas décadas, a sociologia e a antropologia denunciam uma preocupante perca da sociodiversidade mundial. Quer dizer, inúmeras técnicas, costumes, ancestralidades, modos de vida dissolvem continuamente devido, principalmente, a expropriação dos povos nativos dos seus espaços (florestas, margens dos rios, sertão, zona costeira etc). Sabe-se que a cultura é uma manifestação social mutante, todavia, as transformações devem partir de uma escolha social e não de imposições, ou seja, a mudança enquanto possibilidade e não como pseudodestino (natural).
Além das consequências drásticas retro mencionadas, ocorre outro movimento mais sutil, mas não menos sórdido: a usurpação das possibilidades de conhecer. Grande parte da humanidade deixa de existir diariamente sem acessar a imensidão de conhecimentos socialmente produzidos. Compreendemos que o conhecimento formal (escolas, universidades, centros de pesquisas etc) não é a única expressão sociocultural existente, contudo, jamais poderemos desprezar os conhecimentos químicos, físicos, matemáticos, histórico-geográficos, sociológicos e ambientais até aqui construídos. Também não seria sensato desprezar as várias esferas artísticas; a experiência dos grandes gênios da pintura, da música, do cinema, do teatro e da literatura. Pelo contrário, torna-se urgente democratizar toda essa produção social e com isso possibilitar que novos talentos surjam.
Imaginemos quantos jovens brasileiros talentosos nem mesmo descobrem seus talentos. Nossa educação básica é falha e os meios de comunicação de massa (principalmente a televisão) reproduzem a mesmice e tolhem a criatividade. Aristóteles dizia que a matéria transforma-se a partir do movimento entre ato e potência. Somos ato sempre em potência de nos transformamos. O produto desde movimento, em grande parte, depende das condições socioeducacionais nas quais estamos emersos, circunscritos, embebidos e rodeados. É preciso elaborar mecanismos capazes de conduzir esse processo. Nosso País quer democratizar o acesso ao uso da internet em alta velocidade, mas não consegue propor políticas efetivas de barateamento dos livros.
As funções da escola básica e os conteúdos disciplinares vêem constantemente sendo reduzidos a uma antecâmara do vestibular. Somente um período pelo qual todos devem passar. A literatura, as línguas, as ciências, as humanidades devem ser trabalhadas não para responder a uma prova, mas para possibilitar aos alunos um conjunto de escolhas e visões de mundo, para que daí eles mesmos possam construir as suas.