segunda-feira, 17 de maio de 2010

A Linguística nas Escolas

Por Nicolai H. Dianim Brion

É difícil definir o papel nas escolas de uma ciência cuja origem é relativamente recente, principalmente quando comparada às ciências clássicas, como a matemática ou a filosofia. Quase tudo em linguística ainda tem aquele cheiro de novo, especialmente em alguns campos de estudo a ela associados, como é o caso da sociolinguística, da psicolinguística e da neurolinguística.
As pesquisas mais antigas em algumas dessas áreas datam da década de 1940, ou seja, ainda estamos engatinhando no que diz respeito às amplas possibilidades investigativas que se colocam à nossa frente. Mesmo a linguística de forma tradicional, quer dizer, dissociada de qualquer outra ciência humana ou biológica, tem pouco mais de um século de vida.
Se ainda não há consenso entre os educadores sobre qual deve ser o papel hoje, nas escolas, de uma ciência milenar, como a filosofia, ou ainda, se a filosofia deve ou não ter algum papel nas escolas, o que dizer sobre a linguística?
O estudo da língua portuguesa no Brasil, tradicionalmente, sempre foi muito gramático, muito normativo. Até os dias de hoje sabemos que isso é prática comum. Diversos professores, notavelmente os mais antigos, ainda querem abordar a língua através da gramática normativa. Desejam que seus alunos decorem regras que, aos seus olhos, não fazem nenhum sentido, e que façam centenas de exercícios completamente descontextualizados. E quem pode culpá-los? Não foi assim que eles aprenderam?
Mudanças são com frequência motivo de desconforto, podendo até gerar traumas, se não forem bem planejadas e gradualmente implementadas. O professor “gramaticalista” recusa-se a conhecer novas teorias basicamente por dois motivos: por não dispor de tempo e/ou incentivo para buscar se inteirar das mais novas pesquisas em sua área do saber, ou, simplesmente, por não estar inclinado a alterar sua forma de trabalho, fruto de puro comodismo.
Os professores da nova geração, isto é, aqueles que tiveram oportunidade de estudar linguística mais a fundo ao longo dos quatro ou cinco anos de faculdade, costumam ser mais abertos e veem a necessidade de novas abordagens ao ensino de língua portuguesa nas escolas, segundo uma visão mais analítica e contextual, própria da linguística.
Embora esse seja um grande avanço, confessar a necessidade de mudança não é o bastante. O grande desafio reside em como promover alterações significativas no que está posto, ou, em outras palavras, como transportar o riquíssimo universo das teorias, debates e pesquisas mais recentes na área da linguagem, para a nossa prática docente, de modo que a fascinação e o interesse que sentimos ao ocupar as carteiras das universidades possam também fazer parte da vida dos nossos alunos.
Por que não trabalhar leitura, compreensão e produção escrita sob o enfoque da teoria dos Gêneros Textuais, de Marcuschi? Ou pela ótica da teoria da Tipologia Textual, de Travaglia? Por que não permitir que nossos alunos ao menos saibam que essas teorias existem e o que defendem? Por que não promover um momento de debate, para que então tenham condições de optar pela que melhor atende às suas necessidades?
Estudos como esses certamente contribuiriam de maneira muito mais eficaz para a formação de futuros cidadãos conscientes, críticos e aptos a enfrentar os múltiplos e complicados desafios da vida moderna, do que saber a classe gramatical de uma lista de palavras ou ecoar pelos seus anos de vida o som do preconceito linguístico.